Livro polêmico sai em defesa de agrotóxicos e aponta riscos no consumo de orgânicos
Num momento em que o mercado de produtos orgânicos só cresce e a discussão sobre o uso de agrotóxicos está superaquecida, um livro polêmico chega ao mercado: "Agradeça aos Agrotóxicos por Estar Vivo" (editora Record), de Nicholas Vital. O autor é jornalista, já visitou mais de duzentas fazendas em sua carreira de repórter e decidiu sair em defesa dos pesticidas para "contribuir de maneira equilibrada" com esse debate.
O livro foi lançado oficialmente nessa terça-feira, 18 de junho, em São Paulo, e traz uma visão embasada sobre o mercado de defensivos agrícolas no Brasil. "Acho que o discurso é muito pouco equilibrado. O que me estimulou a fazer esse livro foi desmistificar essas falácias sobre agrotóxicos, esses discursos que ninguém rebate", diz Nicholas.
Em oito capítulos escritos com o material coletado em dezenas de entrevistas e diversos artigos científicos e análises publicadas na imprensa, o jornalista critica os orgânicos, sai em defesa dos agrotóxicos e se propõe a explicar como funcionam os pesticidas, suas classificações, as principais pragas que acometem o Brasil, como elas se espalham, os mitos em torno do assunto e como funcionam as leis que regem a aplicação desses produtos. Conversamos com o autor e abaixo seguem algumas das principais informações que ele traz em sua obra:
Por que sair em defesa dos agrotóxicos?
É preciso entender, antes de mais nada, que essa é uma tecnologia fundamental para a produtividade das fazendas. A maioria das pessoas na cidade não sabe como é feita a produção da alimentação em campo, acha que plantar só orgânicos é a solução para tudo. Não é. Não se pode abrir mão dessas tecnologias, desse pacote tecnológico, que inclui não somente os pesticidas, mas também os fertilizantes. O sonho dourado de todo produtor rural é não ter que usar agrotóxico, até porque o maior custo dele é justamente com os defensivos. O que hoje sustenta a economia brasileira é o agronegócio verdadeiro, não a agroecologia. Meu objetivo é contar o outro lado da história para que haja informação suficiente para contribuir com esse debate.
As notícias que a gente lê apontam para um uso indiscriminado dos agrotóxicos, isso não é um problema?
Uso indiscriminado é ruim mesmo, incorreto, isso é um problema e está destacado no livro. Mas é preciso desmistificar um monte de coisa. Muito se fala que o Brasil é o campeão mundial no uso de agrotóxicos – e é mesmo. E isso acontece porque o Brasil é o único país que faz agricultura relevante em larga escala nos Trópicos! Nos Estados Unidos e no Hemisfério Norte, o inverno rigoroso, com neve, limpa e esteriliza a terra. Aqui é diferente, tem clima ameno o ano inteiro, dá para cultivar alimento o ano todo, então o lado negativo é que as pragas têm comida o ano todo também. É por isso que a gente usa agrotóxico durante 12 meses. E ainda tem muito espaço para aumentar esse uso sem caracterizar uso indiscriminado. Para se ter uma ideia, o Brasil colhe 146 kg de alimento para cada dólar investido em agrotóxico, o Japão colhe 8 kg. E é o país com maior expectativa de vida. Ou seja, é um assunto muito deturpado. Tem um monte de besteira sendo dita, sem contextualização, e o pessoal acredita em qualquer coisa.
Mas é fato que existem abusos e alguns alimentos estão sempre na lista dos mais contaminados. Como o consumidor fica nessa história?
O consumidor é o que mais sofre e paga o pato, porque está sendo manipulado. Ele acha que está sendo envenenado e que, ao consumir orgânicos, vai estar livre de contaminação, o que não é verdade. Tem que ter certificação, garantia de origem. Orgânicos e convencionais, desde que seguidas as boas práticas, não tem problema nenhum em consumir. E tem muito orgânico porcaria no mercado. Do lado dos convencionais, a mesma coisa: tem a questão das boas práticas agrícolas. Agrotóxico é igual a remédio: para comprar, tem que ter um receituário agronômico, onde vai estar descrito o equipamento de proteção adequado para o trabalhador usar durante a aplicação (e menos de 15% usam no Brasil!), o tempo certo para esperar antes de colher, etc. Se tudo isso for seguido, a hora que você colher o alimento não vai ter resíduo ou vai ter resíduo de parte por milhão, que é um número totalmente seguro e padronizado no mundo todo. É um número ínfimo e muito seguro, mas tem que seguir à risca a cartilha.
Mas todos os produtores seguem à risca essa cartilha? Como saber?
Tem um problema muito grave de educação no Brasil e muitas vezes os produtores não seguem o que tem de ser seguido. Se for usado de maneira descontrolada, o agrotóxico é prejudicial. O mau uso nem sempre ocorre por má fé, mas por falta de educação e experiência. Se o consumidor quiser consumir algo que seja seguro, a dica é comprar de grandes redes, porque eles fazem análises de resíduos. Produtos com certificação de origem são confiáveis. Os grandes varejistas têm os produtores cadastrados, fazem análises, notificam os produtores e descadastram aqueles que fazem mau uso dos pesticidas. Eles investem muito dinheiro nisso. Se você compra direto do produtor, você não sabe como ele está produzindo, é preciso procurar certificação.
Lavar ou cozinhar ajuda a tirar eventuais resíduos?
Lavar é fundamental sempre, mas não só para os alimentos convencionais, para os orgânicos também. É possível que fique algum resíduo de pesticida na casca, que sai com a lavagem. Mas alguns entram na planta, na seiva, então não adianta lavar. Por isso é tão importante confiar no produtor, porque precisa respeitar o tempo para colher, pois a planta consegue eliminar o pesticida sozinha, como a gente elimina os remédios. Como regra geral, vale a dica: lavar bem a casca para remover possíveis resíduos de agrotóxicos de contato, ou seja, aqueles que são aplicados sobre a planta. E, no caso dos agrotóxicos sistêmicos, aqueles que são absorvidos pela planta, o produtor tem que respeitar o tempo de carência para colher, por isso o melhor é escolher alimentos certificados. Dessa forma, não há nenhum risco. Se você cozinhar o produto, aí é tudo eliminado.
Se os pesticidas são tão fundamentais e oferecem risco mínimo, o que você acha que deve ser feito para que sua aplicação seja, de fato, segura para produtor e consumidor?
Hoje temos 5 milhões de propriedades rurais no Brasil inteiro. As tecnologias estão dadas, mas tem que usar direito. Como disse, é um problema de educação, que é sério no Brasil. E tem outra questão: quando ocorre um abuso ou um uso indevido, ninguém é punido, e isso é errado. Tem que ter uma fiscalização eficiente no campo, na loja agropecuária, porque tem muita loja que vende sem o receituário, o que é proibido. E tem que ter fiscalização também no alimento final, um sistema nacional de análise. Não pode deixar tudo na mão do varejista. Mas eu acho que tem que fiscalizar orgânicos também, não só os alimentos produzidos de maneira convencional. Precisa agilizar também o registro de agrotóxicos para que a gente possa usar tecnologia mais atualizada, e algumas até em caráter emergencial, para evitar que novas pragas se alastrem pelo país. Eu prezo por boas práticas agrícolas, porque tanto convencionais quanto orgânicos podem ter problemas.
Você critica bastante a defesa atual em torno dos orgânicos.
Eu não sou contra os orgânicos, acho que a gente precisa dos dois, mas eles são produtos de nicho, que representam só 1% do mercado, e não podem ser impostos aos outros 99%. De maneira geral, o nosso produto convencional é seguro. Em geral, as análises dos convencionais mostram que só 1% dos alimentos estava acima das recomendações em termos de contaminação por agrotóxicos. Mesmo assim, se o consumidor comer esse produto, não vai morrer, não vai acontecer nada. Se você acredita em orgânico e tem condição de pagar, compre, mas procure o certificado, porque pode ter outro tipo de contaminação, como coliformes fecais.